Diga Bom Dia com Poesia - segunda-feira


 

Cá estão os nossos poemas de 2.ª feira

Pré- escolar/1.º ciclo

OS NOMES

Há quem se chame valente
e seja um valente cobardola;
há quem se chame Redondo
e não goste de jogar bola.
 
Há quem se chame Bispo
e não goste se sermões;
há quem se chame Belo ou Bela
e seja feio como a noite dos trovões.
 
Os nomes só servem
p’ra nos desorientar,
acho que eles
só querem brincar,
brincar, brincar.
 
O senhor Pardal não tem bico,
e penas também não tem.
O senhor Mata, que eu saiba,
nunca matou ninguém.
 
O senhor Peixe não sabia nadar
e morreu afogado.
E o senhor carpinteiro?
Acho que é advogado.
 
Os nomes só servem (…)
 
O senhor Lisboa
vive em Bragança,
o senhor Bragança
vive no Porto;
e o senhor Porto vive em Lisboa
desde criança.
 
O Feliz não acerta uma.
O Ventura não tem sorte nenhuma.
Já a Felicidade chora os dissabores,
enquanto ri a Maria das Dores.
 
Os nomes só servem (…)

Poema de Álvaro Magalhães

2.º Ciclo

Os Livros

 

Apetece chamar-lhes irmãos,
tê-los ao colo,
afagá-los com as mãos,
abri-los de par em par,
ver o Pinóquio a rir
e o D. Quixote a sonhar,
e a Alice do outro lado
do espelho a inventar
um mundo de assombros
que dá gosto visitar.
Apetece chamar-lhes irmãos
e deixar brilhar os olhos
nas páginas das suas mãos.

 

José Jorge Letria

3.º ciclo

Eu Sou do Tamanho do que Vejo

Da minha aldeia veio quanto da terra se pode ver no Universo...
Por isso a minha aldeia é tão grande como outra terra qualquer
Porque eu sou do tamanho do que vejo
E não, do tamanho da minha altura...
Nas cidades a vida é mais pequena
Que aqui na minha casa no cimo deste outeiro.

Na cidade as grandes casas fecham a vista à chave,
Escondem o horizonte, empurram o nosso olhar para longe de todo o céu,
Tornam-nos pequenos porque nos tiram o que os nossos olhos nos podem dar,
E tornam-nos pobres porque a nossa única riqueza é ver.

Alberto Caeiro, in "O Guardador de Rebanhos - Poema VII"
Heterónimo de Fernando Pessoa

 Secundário

Dies Irae

 

Apetece cantar, mas ninguém canta.
Apetece chorar, mas ninguém chora.
Um fantasma levanta
A mão do medo sobre a nossa hora.

Apetece gritar, mas ninguém grita.
Apetece fugir, mas ninguém foge.
Um fantasma limita
Todo o futuro a este dia de hoje.

Apetece morrer, mas ninguém morre.
Apetece matar, mas ninguém mata.
Um fantasma percorre
Os motins onde a alma se arrebata.

Oh! maldição do tempo em que vivemos,
Sepultura de grades cinzeladas,
Que deixam ver a vida que não temos
E as angústias paradas!

Miguel Torga, in 'Cântico do Homem'



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