Crónica

Judiaria


Pai, já te devia ter dito, mas receio que tu me acuses de ser cobarde. Já te devia ter dito que a minha vida na escola está a ser muito difícil. As dores de barriga não são nada físico, são formas que o meu corpo encontra para dizer que tenho medo. Se calhar já lhes devia ter feito frente, mas eles são muitos e são maiores do que eu e dizem-me que se eu me queixar a alguém ainda vai ser pior. Nunca percebi o que os leva a gozarem comigo. Não pode ser só por causa dos meus óculos. Eu quero acreditar que o problema não está em mim, mas às tantas já não sei. Eu não queria deixar de gostar do que sou, se perco isso, se me entrego ao que eles querem, deixo de ser eu. Às vezes apetece-me responder e chamar-lhes nomes, mas eu não quero deitar fora uma coisa tão bonita que um professor me ensinou e se chama assertividade e por isso mordo os lábios, fico com lágrimas nos olhos e, quando eles me deixam passar, sigo o meu caminho. Sinto-me tão indefeso. Há uma palavra inglesa que define a humilhação que sinto. Eu sei que no teu tempo lhe chamavam judiaria e fazia parte do processo de crescimento. Era para enrijar, dizes tu. Mas tenho de te dizer que já não aguento mais. Desculpa se te pareço cobarde, mas se tu me pudesses ajudar eu amar-te-ia ainda mais.
                                                                                                  Vítor Encarnação in Diário do Alentejo

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